Lembranças de Carnaval

A minha timidez nunca me permitiu grandes aventuras. Jamais fui chegado a bailinhos, e de Carnaval, então, nem se fala.

Na minha infância remota, em Extrema – MG, onde às vezes ia passar o feriado de Carnaval, meu tio Valdomiro, irmão do meu pai, católico fervoroso e beato dos mais ativos na cidade, não via com bons olhos aquelas festividades todas, que para ele tinham mais a ver com o diabo; mas eu dava minhas escapadelas e ficava na praça vendo toda aquela inocente animação. Um ou outro que bebia além da conta e que passava dos limites era convidado a se hospedar por uma noite na cadeia até passar a bebedeira.

Em São Paulo, já quase adulto, devo ter ido a uns poucos bailes de Carnaval, sempre acompanhando outras pessoas "só para ver como era", eu dizia. Mas ficava em um canto, tímido, não pulava, esperando as horas passarem para eu voltar para o meu cantinho lá em casa. "Meu Mundo e Nada Mais", como na música do Guilherme Arantes, era tudo o que eu mais desejava.

Acontece que um dos meus cunhados tinha uma sobrinha, da minha idade, morena, linda, com um corpo exuberante. Tínhamos contato vez ou outra quando as famílias dividiam algum apê no litoral. Eu sempre nutri por ela uma certa paixão não correspondida. Apesar da mesma idade, ela era muito mais vivida, preferia caras mais vividos iguais a ela. Mesmo assim tínhamos uma certa amizade.

Uma vez pintou um baile de Carnaval na AABB de São Paulo, na Estrada de Itapecerica. Resolvi ir, acompanhando meu irmão, irmã e cunhado.

Ela também estava lá, linda, toda vestida de havaiana, requebrando do meio do salão. Só que junto com ela estava o seu fiel escudeiro, um vizinho gay, seu amiguinho íntimo, acompanhado de outros gays.

Além de eu não ficar com ela, o seu escudeiro resolveu me paquerar. Igualmente de havaiano, vestindo um sarongue, cada vez que se aproximavam de mim ele dava um giro de 90°, tirando-a do meu caminho, para ele próprio esfregar seu traseiro em mim. Por respeito a ela, não lhe desferi uma bofetada.

Tempos depois ainda tive o prazer de ir com ela a um outro Carnaval no Clube Atlético Ypiranga, onde desta vez rolaram uns amassos. O seu fiel escudeiro, coitado, já tinha sido levado pela AIDS.

E assim terminou de vez a minha vida carnavalesca. Desculpem alguns aqui, se tenho me tornado um tanto repetitivo quando falo de gays, mas a minha vida toda foi repleta de incidentes com eles.

e-mail do autor: [email protected]