ETERNA GEOGRAFIA

No início da década de 70, meu filho Moacyr, com 11 ou 12 anos, faz o primário, com o irmão Maurício, no Grupo Escolar da Vila Yara, em Osasco, logo após nossa saída do Braz e do "Grupo Escolar Romão Puiggari".
Período de adaptação à nova escola, encontram um ambiente muito bom, não tem grandes dificuldades nos relacionamentos com novos colegas o que, pra uma criança, é a coisa mais natural desse mundo.
Um belo dia Moacyr chega com a costumeira lição de casa. Dessa vez, me apresenta uma folha mimeografada com perguntas seguidas de linhas pontilhadas para as devidas respostas. Aprecio a folha, vejo rapidamente as perguntas, sem me deter em nenhuma delas. Moacyr começa a preparar as respostas e me faz uma pergunta, deixando claro que não quer ajuda, mostra que sabe quase todas as respostas, apenas solicita uma confirmação: “Pai, os tios, Arnaldo, Oswaldo e Vicente são brasileiros?” Respondo afirmativamente e indago que matéria ele está respondendo pra ter perguntas desse teor. Ele me diz:
– É geografia, pai! E você precisa ver como ficou a situação de alguns colegas, uns não tem tios, outros tem só tias, outros só dois e um japonesinho que só tem tios estrangeiros… Nós vimos as perguntas fora da classe, na saída da escola e não deu pra perguntar pra professora. Ela disse que quer as respostas pra amanhã e deixou bem claro que não admite ajuda dos pais, por isso não vou te perguntar nada e você não vai me ajudar em nada, quero fazer tudo sozinho porque é relativamente fácil. O Minoro, quase chorou, não tem tios brasileiros, e não sabe como vai responder.
– Ora, isso não está muito correto, o aluno não está na obrigação de ter tios e, assim mesmo, se os tiver, não precisam, necessariamente, serem brasileiros. Ele, o Minoro, e os outros, não…
– Ahh não sei pai! – interrompe – tia Guiomar é muito severa e a turma está com medo danado, amanhã vamos saber… Eu estou tranqüilo… Tenho tios até de sobra… Podia emprestar alguns pra eles, não? – Arremata, rindo Moacyr.

Dia seguinte, volta da escola, pergunto logo como ficaram os seus colegas. Moacyr começa:
– Pai, todo mundo errou, inclusive eu…
– Ué… Por que isso?
– Olha só, ninguém deu nomes certos…
– Você não sabe escrever Arnaldo, Oswaldo…?
– Veja pai as perguntas: "dê o nome de três tios brasileiros". – Olhei e não entendi, como não entendi também a pergunta sobre tios… Verifiquei com mais atenção e descobri: O mimeografo, cópias precárias em matéria de limpeza e nitidez, a letra "T" dos tios, borrada, era nada mais, nada menos do que "R", que um borranzinho, transformou-o em "T". A pergunta certa é: "Dê nome de três RIOS brasileiros”
Isso ocorre no tempo em que se podia, ainda, pensar em tios, como "acidentes geográficos…"
Modesto

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