Porte de arma, segurança ou insegurança?

Nos meus últimos anos de empregado trabalhei em vendas técnicas, de 1987 a 1994, quando institui meu próprio negócio, forçado e reflexo ainda pelo plano Collor e até hoje estou em atividade como profissional liberal.
 
Sempre trabalhei em produção, montagem e instalação e assistência técnica de equipamentos industriais, até que em 1986 um amigo de faculdade, Domingos Marmo, que nos deixou cedo, me chamou para trabalhar em vendas, relutei, pois achava que meu negócio era piso de fábrica e não vendas, mas a insistência era tanto que resolvi aceitar. Pedi demissão em 1987 e fui à luta no novo desafio, e por sinal me dei bem, me desenvolvi na área, não fiquei rico, mas é um trabalho de comunicação muito bom, se conhece tudo e todos; diferente de ficar preso em uma fábrica.
 
E, devido a isso, conheci a maioria dos bairros da cidade de São Paulo, assim como o interior, e viajei muito pelo Brasil, principalmente quando fui para o setor de desenvolver revendedores em diversos estados.
 
Em 1989, fui convidado por ele para fazermos um curso de tiro no Clube Hebraica, situado nos Jardins, com entrada pela Marginal Pinheiros, onde ele já frequentava. Não gostei da ideia, mas, mais uma vez, acabei aceitando e fomos a esse curso de um mês de duração, todos os sábados, período integral, patrocinado pela indústria de armas Rossi. Vale ressaltar que o objetivo disso era a nossa segurança, pois andávamos muitas vezes com alguns valores e a empresa onde trabalhávamos não sabia de nada e creio que nem apoiaria.
 
Usamos vários tipos de armas, principalmente os calibres 22 e 38, e atirávamos em um alvo com protetor auricular e a cada aula sobre um tipo de tiro e posição havia uma disputa para o melhor atirador aprendiz no final do dia.
 
E a cada sábado uma aula nova e diversos tipos de desafio, importante saber que também tínhamos muita teoria sobre uso e legislação, sobre como usar e onde usar a arma.
 
Nossa turma era de 15 pessoas, aproximadamente, e a maioria era viajante e se sentia insegura pelas estradas, como vendedores e trabalhadores externos técnicos.
 
Após um mês, recebemos nossos certificados e na semana seguinte fomos comprar as nossas armas no Mappin, da Praça Ramos, naquela época tinha muitas casas que vendiam armas com vitrines quase na calçada, como na São Bento e no final da Rua Florêncio de Abreu com Paula Souza, além de outras lojas.
 
O vendedor pediu os documentos normais e compramos a mesma arma: uma Taurus calibre 38 e os cartuchos e saímos armados da loja e pensando que estávamos seguros, doravante e não sei por que comprei um coldre de pernas, que nunca usei.
 
Agora era só carregar o “berro” e sair com segurança, mas na realidade nunca usei a arma, a não ser em um sítio, e guardei durante uns 20 anos, em local seguro, onde ninguém em casa pudesse encontrá-las, nem a esposa, nem os filhos e sempre descarregada.
 
Em 2006, começa uma campanha do desarmamento em São Paulo, para quem tivesse uma arma legalmente ou não que a entregasse a polícia com um valor a ser pago pela tal, um valor irrisório que não animava ninguém, relutei no início a aceitar essa ideia.
 
Parecia que além do meu anjo de guarda eu tinha um reserva para ele, que era a arma de fogo, se meu anjo falhasse, entraria o reserva, mas conversando com outro amigo de bairro que também tinha uma arma e que queria devolver, mesmo porque a ameaça do Estado (governo) começou a preocupar e a renovação do porte seria cara e mais difícil, devido aos pré-requisitos rigorosos.
 
Conversei com um sobrinho delegado que me orientou a devolver, passou umas instruções e em maio de 2007 fui até a delegacia do Morumbi com um amigo de bairro que também estava com vontade de fazer e a devolvi, recebemos o comprovante de entrega e não sei por que sai da delegacia aliviado, parecia que aquela arma pesava em mim.
 
Passado alguns anos, notei pela imprensa que a quantidade de pessoas com arma aumentou, óbvio que pessoas do mal e muitos do bem também ainda as possuíam e obtiveram mais. Não esqueço que quando devolvi as armas parecia ouvir, às vezes, o meu anjo mal falando no meu ouvido esquerdo: você fez besteira seu bobo, e no ouvido direito o meu anjo bom retrucava: não liga para ele, você está correto, fez bem em devolver, eu vou protegê-lo na vida e esse som era mais forte e melhor e hoje não tenho a menor vontade de ter mais, mas me assusta quando leio e vejo pela mídia a quantidade de armas na praça.