Nossa rua, no trecho em que exitou a nossa vida, era delimitada ao sul pela esquina da Av. Leôncio de Magalhães e a norte pela esquina da Durval Clemente.
Quem conhece percebe logo que é um pequeno trecho dessa rua, que na verdade começa lá longe, na esquina da Almirante Noronha e termina numa íngreme subida na Av. Nova Cantareira.
Então, naquele pequeno trecho aconteceu nossa infância e uma primeira adolescência.
Ali a Beatlemania, a Jovem Guarda, a repressão da ditadura, os Festivais de Música da Record.
Ali na esquina o tio atropelado.
Ali a deusa indiferente que subiu sem olhar.
As primeiras garoas do inverno.
O Natal na solidão.
Ali os dias longos e as esperanças curtas.
Ali duas famílias numa pequena sala.
Um livro apenas entrevisto.
Uma decepção e o conhecimento da decepção.
A incompreensão de adultos.
A agressão gratuita.
Os grandes desejos.
Naquele pequeno trecho de rua os balões de São João.
O desejo terrível de ir junto, mas ficar.
A padaria, o bar, o misto quente.
A feira atrás do quarteirão.
O ônibus elétrico.
O ponto final e a passagem exata apenas.
O vulto do Pai e da Mãe.
O sacrifício da Mãe.
Rua Gaspar Soares, Jardim São Paulo.