Antes de mudar para a Lapa, em 1959, morei pros lados de Mirandópolis (Vila Mariana).
Mas sempre frequentei a zona oeste, pois minha avó morava na Albion, uma casa que meu pai comprara na esquina com a Guaricanga, nos tempos em que era ferroviário (Diretor do Instituto de Caixas e Pensões da São Paulo Raillway).
A casa foi cedida para que meus tios e minha avó morassem. Nela habitavam, além da "nonna", meus tios: Roque, Lúcia (viúva e com um filho) e minha tia Lydia (na época ainda solteira).
Até meus nove anos, assiduamente nos fins de semana íamos visitar minha avó, e não era raro eu pernoitar lá, para poder brincar com meus primos que tinham minha idade.
Era uma época que a Rua Albion ainda estava sendo asfaltada e até pouco tempo a via ainda era coberta de terra. Contava meu tio que muito frequente eram acordados no meio da noite, pois o caminho era conhecido como "estrada da boiada" (sem alusões às falcatruas de algumas figuras públicas), e os bois se encostavam nos muros da casa para uma eventual coçadinha, tocando distraidamente a campainha.
Mas lembro muito bem do lugar na época: na rua existiam algumas enormes manilhas espalhadas, que estavam sendo instaladas para a expansão de serviço de esgoto. Montanhas de terra eram retiradas dos buracos feitos pela prefeitura, cenário onde eu e meus primos vivíamos nossas aventuras de "Lanceiros de Bengala", "Forte Apache" etc… Sonhos e fantasias infantis!!!
São Paulo ainda não era essa gigantesca floresta de concreto que é hoje. O vento soprava do centro para a zona oeste e às vezes trazia um odor enorme, às vezes muito forte e desagradável, vindo ou do curtume nas proximidades da Rua Guaicurus, ou da fábrica de sabão da Indústria Matarazzo, na Avenida Água Branca, em frente ao Palmeiras.
Lembro muito bem do forte cheiro. Como era desagradável ter que senti-lo.
Hoje, com o distanciamento do tempo, relembrando as páginas da "aurora da minha vida", do tempo em que nas escolas era distribuída a revistinha "O Crisol", sinto saudade daquele odor. Sinto uma enorme saudade e até acho que fui muito severo com ele. Quem me dera poder voltar aos tempos em que eu perguntava a meu pai porque o ar estava tão fedido.
Gostaria de desejar às próximas gerações que um dia possam lembrar dos cheiros da infância. Deus permita que elas tenham lembranças tão lindas que hoje se transformam em verdadeiro perfume.
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