Eu trabalho na São Paulo Alpargatas desde 1981. Iniciei na fábrica de Pernambuco, na cidade de Jaboatão dos Guararapes.
Em 1986 eu fui convidado para trabalhar em São Paulo e após toda aquela confusão de despedidas, negociações e promessas, vim para esta cidade, no dia quatro de agosto de 1986. Lembro-me que o dia estava muito frio. E que frio!
Naquela época não tínhamos os diversos flats e hotéis espalhados pela cidade. Os principais hotéis ficavam no cento da cidade e foi hotel Nobilis (Rua Santa Ifigênia, 72) que fiquei durante um mês e meio até encontrar um apto na Rua Dr. Seng, e para lá me mudar.
Eu deveria, no meu primeiro final de semana em São Paulo, sair para procurar um apartamento. Estávamos no auge do Plano Cruzado e faltava muita coisa devido ao congelamento de preços. Não era possível encontrar era um guia de ruas e também não havia Internet. Então, andar pelas ruas a procura de um apartamento foi minha ocupação nos finais de semana.
Sábado, dia nove de agosto de 1986, começou minha peregrinação. Saí cedo do hotel e na Rua Antônio Godoi, iniciou-se uma chuva. Cruzei a rua às pressas e me dirigi ao único ponto de referência que havia guardado: o Mappin da Praça Ramos. Fui lá procurar por um guarda-chuva.
Ao entrar no Mappin me deparei com diversas pessoas que estavam no centro fugindo da chuva. Ao adentrar, fiquei espantado. “Que loja grande! E agora?” Pensava.
Pensei: “nada como seguir a multidão.” Seguir é força de expressão. Fui "conduzido" até um dos elevadores pelas pessoas a minha volta, em um empurra-empurra de quem sabia para onde ir – as pessoas – e de quem não sabe para onde vai – eu.
Uma vez dentro do elevador, minha surpresa: o ascensorista "cantava" o jogo.
– “Primeiro andar: calças, camisas, paletós, cintos…”.
No segundo andar, lá vai o camarada:
– “Calcinhas, sultiens, saias, blusas…”.
– “Oba. Na hora que ele falar guarda-chuva eu desço.” Pensei.
E lá vamos nós. Terceiro andar:
– “Cama, mesa e banho…”.
Quarto andar:
– “Artigos de pesca caça, camping…”.
Quinto, sexto, sétimo e nada de guarda-chuva…
Achei que tinha perdido a chamada. Iria ter que prestar mais atenção. Colei no ascensorista e fiquei por ali. Desce elevador, sobe elevador e nada de guarda-chuva.
Na quarta vez o moço olhou pra mim e perguntou:
– “Está gostando?”
Balancei a cabeça afirmativamente e, morrendo de vergonha, desci no térreo. E lá estavam eles: os guarda-chuvas ficavam no térreo. Por isso que ele não falava guarda-chuva, reclamei para mim mesmo.
E lá fui eu comprar o guarda-chuva. Naquela época estes itens não custavam dez reais como hoje, eram caros! Peguei um guarda-chuva e me dirigi ao caixa.
Peguei o talão de cheques, preenchi a folhinha e entreguei à mocinha, que me pediu o RG. Pronto, “o que é que ela quer?”, pois não havia entendido o pedido dela. Comecei a me coçar (ou seja, colocar a mão nos bolsos) e perguntei:
– “Como?”
E ela repetiu:
-“RG”.
Aqui vale uma observação: na “minha terra” chamamos RG de Carteira de Identidade. Não tem esse negócio de RG. A moça queria RG e eu não sabia o que era.
E ali estava eu: querendo comprar um guarda-chuva, com o cheque preenchido e a mocinha querendo um tal de RG.
– “Valha-me Deus. O que eu faço?”, pensei.
Só me restava colocar tudo o que eu tinha, nos bolso, na frente da moça, e ela escolheria o que quisesse, pois a fila às minhas costas poderia ficar furiosa.
Para minha felicidade, a moça compreendeu e pegou o meu RG. “Ufa. Escapei de mais uma.” Consegui comprar o guarda-chuva!
Fui embora procurar o apartamento. E, ao sair, percebi que a chuva tinha passado…
Esta foi minha primeira compra no Mappin.
E-mail: [email protected]