A Turma da Carneiro – O velho das cabras

1950. Rua Pedroso 41. Liberdade.<br> Estou na calçada, defronte a "Padaria e Leiteria Pedroso", de meus pais Armando e Joanna.<br> Dia 5, entre 8 e 9 da manhã, ouço o soar dos sininhos, vindo da Rua Barão de Ijuí. O tilintar aumentando e logo entrando na Rua Pedroso. Quem está chegando é o SEU JEREMIAS, pastoreando suas 6 cabritas de leite, em 3 fileiras, como um desfile militar. Todas muito brancas, limpas, sininhos no pescoço, balindo romanticamente(?) seu BÉÉÉÉÉ… Eram muito dóceis estes caprinos.<br> Mamãe colocou açúcar no copo grande, com minhas iniciais. Eu e outros garotos corremos ao encontro do "Velho das Cabras". Homem franzino, magro, barbas e cabelos bem brancos, sempre um sorriso nos lábios, sempre muito feliz, delicado, atencioso, bondoso, só cobrava de quem podia pagar. Certa vez mamãe perguntou a ele qual a razão de tamanha felicidade. O velho respondeu: AMOR, COMPAIXÃO, PACIÊNCIA…<br>Estas palavras ficaram em minha mente até hoje, embora eu não tenha entendido o real significado delas. Hoje, bem mais velho, entendo melhor o que querem dizer e qual o alcance, ou seja, quantos predicados se há de ter para cumprir tais palavras…<br> Bom, o Sr. Jeremias encheu nossos copos com o mais delicioso dos leites que possa existir (vide Cleópatra) e nós o saboreamos, sobrando, ao redor da boca, aquela espuma branca que nos deixa tal qual o palhaço Arrelia.<br> Em 1953, o "velho das cabras" sumiu. Ficamos sabendo, depois, que morreu. Nunca mais apareceu ninguém para substituí-lo, mesmo porque a Prefeitura proibiu esse tipo de comércio…<br> Quando vou a supermercados, às vezes encontro o leite de cabra pasteurizado, embalado em saquinhos plásticos. Custa caro, mas eu compro. Faço como minha mãe Joanna fazia: copo grande com açúcar, coloco o leite e bato no liquidificador para formar aquela espuma de outrora. Fecho os olhos e sorvo, lentamente, tentando voltar àqueles tempos felizes…<br> Dá para enganar. Somente isso.<br><br><br>e-mail do autor: [email protected]