Ele estava dirigindo seu carro quando começou a pensar na sua idade por causa da “fechada” de um motoboy na Marginal do Pinheiros. Para ele, a vida estava bem normal. Nada, que ele percebesse, estava diferente dos outros dias ou mesmo dos anos passados.
Estava voltando de um encontro com amigos e amigas de velha data. Reuniram-se na casa de um deles em Higienópolis. Todos mais novos e, a maioria ou quase todos, haviam sido orientados por ele na sua adolescência até casarem. Reuniram-se porque um deles, que estava morando fora do estado, havia chegado para uma rápida visita.
Animados, conversavam sobre tudo, principalmente sobre os últimos acontecimentos: assaltos a bares e restaurantes, assassinatos de policiais militares, Cpmi, mensalão, caráter dos criminosos e das vítimas, novelas, filhos, netos, política, eleições e por aí iam. Só não conversavam sobre esporte. Os amigos, diferentemente dele, não eram muito chegados a qualquer modalidade esportiva. Quando conversavam, somente ele tocava nesse assunto. Queria, por achar importante, comentar sobre o campeonato brasileiro, os campeonatos europeus ou sobre as vitórias espetaculares do Nadal e do Federer nos campeonatos internacionais de tênis. Todavia, ninguém estava interessado.
Sozinho, dentro do carro, começou a analisar o comportamento (seu e dos amigos) e chegou à conclusão que estava velho, muito velho. Lembrou, por exemplo, que durante toda a reunião ninguém o ouviu ou dava muita atenção ao que tentava falar.
– “E você? O que achou da última condenação do mensalão?”
Antes que pudesse abrir a boca, os amigos estavam falando de outro assunto. Tentou falar, mas ninguém deixava. Sequer para ele olhavam. Recolheu-se ao seu mutismo. Voltou a observar os amigos animados, discutindo sobre isso, sobre aquilo.
Daí, uma amiga, em um momento de rápido silêncio, perguntou a ele o que achava sobre o assunto que discutiam.
– “Bem eu acho que…”
Não continuou, todos estavam em nova discussão. Nem mesmo a que fez a pergunta estava interessada na sua resposta. Voltou ao seu mutismo. Voltou a observar.
Observar era o que mais fazia ultimamente. É verdade que, quando não comparecia às reuniões, todos reclamavam da sua ausência. Todos e pareciam muito sinceros. Demonstravam gostar muito da sua presença. Da opinião, nem tanto.
Outra coisa interessante passou por sua cabeça. Sempre foi considerado um exímio motorista. Era ele que dirigia o automóvel quando saía com os amigos. Era bom mesmo. Tinha, ainda, a vantagem de não gostar de beber.
Porém, passou a notar que ultimamente alguns dos amigos, que como motoristas nunca lembravam que seus carros tinham mais de três marchas, estavam agora demonstrando grande insegurança quando ele estava dirigindo. Ficavam pisando no chão do carro como se fossem brecar ou acelerar; gostariam de sugerir outros caminhos para encurtar o trajeto em 20 metros. Enfim, passaram a demonstrar grande preocupação quando ele dirige.
-“Será que estou dirigindo mal? Será que fui eu que fechei o motoboy e não, ele que tentou passar entre eu e o ônibus? Será? Será?”
Será que estava muito velho mesmo? Mas ele, segundo a opinião dos amigos, não aparentava nem de longe, a idade que tinha! Todos diziam que ele aparentava ter, no mínimo, dez anos menos do que realmente tinha!
Aí, pensou em sua mãe e em sua sogra. Com elas aconteceu exatamente o que estava acontecendo com ele. Lembrou que, algumas vezes, precisou chamar a atenção de seus irmãos e cunhados para que prestassem atenção no que elas tentavam falar e ninguém ouvia ou prestava atenção. Lembrou, também, que uma delas, não identificou qual, lhe disse:
‘'Eles vão ficar velhos, também serão ignorados!”
Ignorados! Essa é a palavra que identifica a situação das pessoas mais velhas. Suas opiniões não interessam a ninguém. Muitas vezes a experiência não serve para nada.
Às vezes, no afã de justificar suas atitudes, os moços de hoje dizem:
-“Ele está velhinho, velhinho. O alemão Alzeimer ou o inglês Parkisson são seus novos amigos.”
É, meus caros e minhas caras, “a velhice é uma m…” como dizia o sempre grande e lembrado Jorge Amado.
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