Um encontro inesperado com o Dops

Começo de Carnaval, 1970. Eu, bem no início da vida profissional, trabalhando em Bauru, no Interior de São Paulo, voltava para a capital para aproveitar o feriado, em companhia de três colegas de trabalho. Viemos em um confortável Aero Willys. Um dos colegas era filho de um dos sócios da empresa, um bem sucedido fazendeiro da região, que aproveitou a carona. Naquela época a viagem costumava demorar cerca de cinco horas. A Rodovia Castello Branco ainda não estava concluída e grande parte do percurso era feito pela velha Marechal Rondon de pista única. 
 
Chegamos em São Paulo no começo da madrugada e já se podia ver algum movimento anunciando o Carnaval. O colega que era filho do dono, não conhecia bem a cidade e precisava chegar em um local na região da Avenida Paulista. Deixamos a Marginal de Pinheiros, que já existia na época, e pegamos a Eusébio Matoso. Estacionamos bem no local onde fica hoje o Shopping Eldorado e acendemos a luz interna do carro para consultar um guia. Acabamos de parar e uma veraneio marrom, sem placas, nos ultrapassou e parou bem à nossa frente. Dela desceram cinco homens fortemente armados com fuzis, comandados por um mulato forte de mais de 1,90m que já foram ordenando que descêssemos todos. 
 
Eles nos revistaram, abriram todas as nossa malas e verificaram nossos documentos. Explicamos o que fazíamos ali e então eles nos liberaram e ainda nos indicaram o melhor caminho para chegar até a Av. Paulista. Muita imprudência e ingenuidade nossa parar ali naquelas condições, quando o regime militar vivia à caça de subversivos. 
 
Eu disse que eram do Dops mas também havia a OBAN naquela época. Até hoje não sei exatamente de onde eram. Claro que ficamos meio apavorados, mas como éramos todos simples trabalhadores e tocávamos a nossa vidinha normalmente, trabalhando, estudando e nos divertindo conforme as nossas possibilidades, não era caso para termos tanto medo. Quem não deve não teme, diz o velho ditado. Quem andava dentro da lei tinha muito mais segurança, naqueles tempos, para se andar pelas ruas à noite ou mesmo de madrugada. 
 
Hoje eu penso em como na verdade estávamos seguros com aqueles caras por perto. Aqueles, que com o pretexto de "restaurar a democracia",  praticavam atos de violência assaltando bancos, jogando bombas em quartéis , enfrentando a polícia e sequestrando embaixadores, esses sim tinham o que temer. Hoje muitos desses caras estão no poder, tentando a todo custo acabar com essa democracia por que "tanto lutaram".