Lá pelos idos de 1953, eu morava no bairro da Água Fria e conheci uma moça que se chamava Maria Augusta e residia nos Jardins, bem perto do Trianon, onde hoje se encontra o Museu de Arte, na Paulista. Naquela época não existia a facilidade e a liberdade que o jovem tem hoje em dia. O namoro e a possibilidade de dar uns beijinhos e uns amassos só eram possíveis na sombra da noite e, no meu caso, nas alamedas do jardim do Trianon. Apesar dessas dificuldades o desejo do jovem era tanto ou maior que agora, pois havia planejamento, estratégia e muita adrenalina rolando para um simples atraco, que geralmente não passava disso.
Naquela época, o fato de uma garota engravidar era o suficiente para virar uma tragédia, às vezes levadas ao extremo, o que obrigava os pombinhos a se casarem diante do delegado de polícia, do sogro babando de raiva do futuro marido de sua filha e não era tão raro quando simplesmente o pai expulsava a filha de casa, muito mais preocupado com a reputação da família do que com a própria filha. Num sábado à noite, lá estava eu, ansioso e com a boca seca, à espera da garota que iria aliviar, com os seus suspiros e seus abraços, aquele fugaz momento que justificaria a confissão na missa do domingo, como se tudo fosse necessário.
A absolvição assim transcorria; em geral esse tipo de situação, naquela São Paulo tão ingênua, graciosa e sem maldade. Isto posto, deixei a garota na porta do seu edifício e saí tremendo as pernas e o corpo, todo aliviado e incompleto, porém muito feliz em busca do bonde que me deixaria na Praça do Correio. Faz-se necessário dizer, para muitos que não conheceram os bondes, havia dois tipos deles; o fechado, que era chamado de camarão e o bonde aberto, no qual os bancos para sete pessoas eram voltados um para o outro, de forma tal que passageiro sentado ficava cara a cara com os outros passageiros.
Pois bem, eu tomei o bonde e fiquei cara a cara com cinco freiras que me fitavam com olhar disfarçado e divertido que provocavam coxixos entre elas, e eu não me dava por vencido, pois sempre fui muito extrovertido; as encarava também, sorrindo até que uma delas me ofereceu um lenço, sugerindo que eu o passasse no rosto. E qual não foi a minha surpresa quando o lenço aparece tingido de batom avermelhado que devolvi, surpreso, com cara de cachorrinho que peidou na igreja.
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