Saudades do Senai Anchieta

Estudei no Senai Anchieta, entre 1958 e 1961. O curso era Marcenaria, pois eu trabalhava em uma fábrica de móveis no Itaim Bibi – a famosa Forma, antiga Artesanal – como aprendiz. Todos os dias, durante o semestre de aulas, ia pedalando minha bicicleta do Itaim, onde morava, até a Rua Gandavo na Vila Clementino. Um detalhe: fazia esse trajeto quatro vezes por dia, já que almoçava em casa. Nessa época o trânsito era uma maravilha e eu tinha apenas 13 anos de idade.

A escola era excelente, pela manhã aulas teóricas, à tarde oficina. A disciplina era rígida e, por várias vezes, fui parar na Diretoria, arrastado pelas orelhas, em razão de brigas ou discussões por futebol. Lá não se permitia fumar, atrasar-se na entrada das aulas, e ai daquele que ousasse desrespeitar qualquer funcionário da escola, do diretor ao servente.

O diretor, saudoso professor Edmur, ameaçava o insubordinado com suspensão ou expulsão, o que significava perder o emprego também. Isso me serviu muito – depois de repetir o primeiro ano e ser advertido de que só me seria permitido estudar naquela escola porque, felizmente para mim, havia vagas ociosas, tomei jeito e no ano seguinte fui o primeiro da turma. O curso era de três semestres, divididos em graus – primeiro, segundo e terceiro graus.

Que saudade da minha turminha – Massao Toi, Osires Carlos do Carmo, Romualdo Biliatti, Otávio, Antonio Carlos Maziero, José Ramos dos Santos, o Pelé – esse cara jogava muita bola, era o craque da escola no futebol de salão, no basquete, no handebol.

Eu e o Negão, como era chamado por nós o José Ramos (ainda bem que na época não vigorava o "politicamente correto", já que não nos movia nenhum preconceito em tratar assim um grande amigo) – tínhamos a mania de escrever letras de música em um caderno durante as aulas. Nossos ídolos eram Litle Richard, Paul Anka, Neil Sedaka, Elvis, Cely Campelo, tanto é verdade que eu o chamava de Negão e ele me chamava de Galo Cego, porque usava óculos. O Massao era o Japonês. Outro colega, cujo nome já não lembro, tinha a alcunha de Boca de Caçapa, e aí por diante. Tinha também o Epitácio, um mulato alto, metido a dançarino e conquistador de mulheres. Imaginem essa turma toda convivendo durante 8h por dia e, no fim das aulas, na piscina.

Nosso professor de ciências era o Pedro Funari, de desenho professo Plínio, de Oficina o Grecco, de português o professor Luso que também era advogado, a psicóloga Dona Alaíde e o orientador professor Carezzatto. Há questão de dez anos atrás, ao passar em frente à escola, não me contive, parei em frente e entrei.

Conversando com o diretor, foi me informado que o sistema mudou completamente. Hoje o Senai possui cursos técnicos e superiores e os estudantes não são mais aqueles jovens pobres oriundos das fábricas, que trabalhavam durante seis meses na indústria e estudavam cinco meses no Senai, recebendo normalmente seus salários.

A psicologia ensina que o nosso caráter é "cunhado" durante a infância e a juventude. Posso dizer, então, com absoluta certeza, que a disciplina do Senai ajudou em muito na formação e cunhagem de meu caráter e acredito também na de todos aqueles que por lá passaram.

Escrevi esta história na esperança de ser lido por um daqueles colegas ou seus filhos e netos, uma vez que já se passaram mais de 50 anos daquele tempo feliz.

E-mail: [email protected]