Registro Geral

Em mais um ônibus vindo do nordeste eu desembarquei aqui em São Paulo. Seu Pedro, Dona Emília, eu e mais três irmãos chegávamos nesta cidade onde tudo nos esperava. No caminho interminável do Ceará até o sudeste não parava de esperar o inesperado, o medo era inevitável. Tinha apenas 12 anos, ouvia falar da insensibilidade, do egoísmo dos paulistas, imaginei na minha mente adolescente uma cidade onde eu não teria lugar, onde seria sempre um "estrangeiro", ser cidadão de segunda classe seria minha sina.

Meu pai que mal sabia ler e escrever, de cara (doces anos 80), conseguiu um emprego numa metalúrgica, emprego esse que nos proporcionou educação, alimento e dignidade.

O tempo passou, meu sotaque mudou, fiz amigos, fui aos poucos me misturando aos nativos, e nativo virei. Não existe ser humano mais paulistano que eu, gosto da pressa, me chateio quando perco um metrô, mesmo sabendo que em três minutos virá outro, guardo papel de balas no bolso.

Ir à praia é um acontecimento, buzino no túnel, adoro ser da cidade da chuva fininha (e não da Veneza Brasileira, ou Maravilhosa, ou Califórnia Brasileira), conheço os mendigos famosos, os loucos de plantão que só existem num lugar como Sampa.

Nunca fui tratado como ser humano de segunda classe, transito em baladas, onde drinques de 24 reais são norma, mas vou ao CTN comer rabada, onde a cerveja é apenas “2 real". Em nenhum lugar sou marciano, pois em qualquer lugar dessa cidade sou deliciosamente mais um, mais um orgulhoso paulistano.

Gosto de ser Cearense no Registro Geral, pois assim dou mais valor em ser paulistano na alma, tanto quanto o japonês, o italiano, o libanês, o acreano, o baiano, o paraibano, o paraense, o nigeriano, o coreano, o judeu, o palestino…

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