O velho largo das 'cinco esquinas', na Rua Santo Antonio, concentrava um grupo de moradores das ruas e quarteirões de nosso bairro. Eram pessoas dos mais diversos perfis (trabalhadores, aposentados, desocupados, alguns 'mais altinhos'), todos ali reunidos para uma prosa corriqueira dos assuntos do momento ou reminiscências do passado.
Com frequência, poderíamos encontrar o velho Tito e seus parentes Amadinho e Jamil, numa roda de conversa com outros contemporâneos como, Amado, Ninho (Lalá), Belém, o velho 'seu' Benjamin, em animadas discussões sobre economia, futebol, política e coisas do nosso cotidiano bairrista ou universal.
Vez por outra, éramos surpreendidos com a presença do Agostinho dos Santos, grande cantor e compositor, além de Wilson Miranda, Antonio Marcos (ex-Vanusa) que, esporadicamente nos faziam uma visita relâmpago.
O Adoniran Barbosa era outro bairrista, mas se concentrava mais ao alto da Rua Treze de Maio, lá pelas bandas do bar da Carmela e, mesmo assim, absorvia a atmosfera de nosso bairro.
Roberto Carlos, o 'Rei', fazia seu roteiro para visitar sua amada, Nice Rossi e, por vezes, utilizava-se de um Ford LTD vermelho, sempre passando quase que incólume pela rua Santo Antonio, sempre por detrás de um par de óculos escuros e cachimbo na boca (ele já 'cachimbou' algumas vezes).
Nossa turma de meninos ocupava os espaços das calçadas para as brincadeiras de pula-sela e corridas com carrinhos de rolimãs, ou mesmo pique-esconde ou mãe-da-rua, quando o trânsito estivesse menos movimentado.
Dos personagens aqui citados, havia um que se destacava pelo emblematismo de sua personalidade. Era Vicente Sesso, famoso dramaturgo e novelista nacional, autor de Uma Rosa Com Amor, Pigmaleão Setenta, Cara a Cara e tantas outras novelas que fizeram sucesso no Brasil e fora dele. Filho do militar Francisco Sesso (aqui, conhecido na intimidade bairrista por 'Tenente') e de Filomena Rotela Sesso (carinhosamente chamada de dona 'Mena'), foi ela, proprietária de uma loja de modas e chapéus para senhoras.
Os primeiros passos para a dramaturgia, Vicente os deu ao lado de seus pais, apreciadores do teatro e amigo de muitos artistas. Vicente começou sua vida artística junto com uma companhia italiana de teatro que, ao representar uma peça em Buenos Aires, viu-se desfalcada de um ator mirim, que ele o substituiu. Estava na tenra idade infantil e, depois de ser contagiado pelo 'micróbio' cênico, não mais parou suas atividade, chegando ao ponto de se transferir para Londres, com a finalidade de aprender as novas técnicas televisivas, inéditas na época. A BBC de Londres foi a sua escola de formação para a televisão brasileira e, quando de seu retorno ao Brasil, participou de grupos teatrais da TV Paulista.
Na época, nossa televisão brasileira ainda era cercada de alguns acanhamentos do tipo espaço e sem muitos recursos, mas isso não ofereceu-lhe nenhuma resistência para expandir todo o seu potencial artístico. Vicente participou de grupos de atores e diretores, palpitando, oferecendo sugestões, corrigindo textos e criando outros, e passou a escrever sozinho suas grandes obras.
Nascido aos dezessete dias do mês de março de 1933, morou na Rua Santo Antonio, no número 968 e, sua casa, por obra do acaso, abrigou nos cômodos inferiores dois grandes nomes de nossa cultura popular. Um foi o próprio Agostinho dos Santos que, por lá viveu na companhia de seus pais. O outro foi Marcos Paulo, ator e diretor de rede Globo de Televisão que, por lá também viveu sua infância e adolescência e em companhia de sua avó, até ser adotado por Vicente Sesso.
Alguns de nós, meninos do lugar, também tivemos aproximadas ligações com o Vicente quando e por ocasião dos comerciais que, na época eram conhecidos por reclames e, já na nova emissora de televisão, a TV Record – Canal 7, fazíamos as apresentações de produtos como 'Ovomaltine' e 'Toddy', além de participações nos programas e seriados como 'Zás-Trás', 'Capitão Sete' e outros programas de cunho infantil.
Vicente Sesso abrigou-se com a sua dramaturgia em todas as emissoras de televisão da época. Excelsior, Paulista, Tupi, Record e Bandeirantes. Contudo, foi pelas mãos de Cassiano Gabus Mendes, que era diretor na TV Tupi de São Paulo que Vicente debutou para o mundo televisivo.
Genioso, sempre buscou a perfeição em tudo o que fazia ou colocava as mãos e sempre palpitava em tudo que cercasse uma encenação, ao ponto de orientar desde o figurino, cenários, iluminação, posição de câmeras e postura dos atores. Enfim, era um misto de escritor, diretor, contra-regra, continuista e cenógrafo.
Hoje, Vicente Sesso vive em uma confortável casa no bairro do Rio Vermelho, em Salvador, Bahia, escrevendo suas obras para os países latinos e da Europa e Ásia.
Mantém o mesmo perfil jovial que o caracterizou anos passados e é dono de uma presença de vida imbatível e inabalável.
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