O surdo-mudo

Em 1980 eu trabalhava numa imobiliária, na Rua Estados Unidos, esquina com Av. Nove de julho no Jardins. Na esquina tinha um semáforo, onde ficavam vários pedintes. Tinha um rapaz, com um papelão pendurado no pescoço, estava escrito. Sou surdo-mudo, preciso de ajuda, Deus lhe pague.

Ele ficou ali durante anos, nunca ninguém percebeu nada. Eu mesmo dei várias vezes esmola a ele. Sempre no farol, tornou-se nosso amigo. Ele sempre ganhava frutas das corretoras, mas como a mentira tem perna curta. Um dia a máscara caiu.

O farol estava fechado, ele estava no meio da rua pedindo esmola, quando ele chegou perto da calçada, veio um carro em alta velocidade, o motorista deu uma brecada de cantar pneus, ele levou um grande susto. O carro quase o atropelou. O rapaz começou a gritar e falar palavrões para o motorista.

Todo mundo começou a rir. Acabou a festa do surdo-mudo, ele teve que mudar de ponto. Depois de anos quando passava pela Av. Giovanni Gronchi, eu o vi num farol com o mesmo papelão, pedindo esmola. Fiz um sinal, ele fingiu que não me viu. Tinha mudado de ponto, escolheu o Morumbi para trabalhar. O surdo-mudo mais mal criado que eu conheci.

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