O sobrevivente

1974! Vivíamos já há dez anos sob a tutela do regime militar instalado no Brasil em 1964, depois da queda do presidente João Goulart (Jango) que como vice-presidente havia assumido o poder depois da renuncia do recém eleito Presidente Jânio da Silva Quadros. A Censura Federal então, passou a fazer parte dos programas da televisão, das peças teatrais e da imprensa falada e escrita da mídia nacional.

Vivíamos ainda o chamado "milagre brasileiro" éramos infelizes e a maioria fingia que não sabia. Afinal de contas o Brasil era Tri Campeão Mundial, e o livro "Brasil Nunca Mais" ainda estava sendo escrito sob tortura pelos seus personagens, nos porões dos cárceres da "nossa" ditadura.

O Programa Silvio Santos com seus picos de 75 pontos no IBOPE, ia ao ar pela Rede Globo Canal 5, São Paulo, nas tardes de Domingo – seguido do Programa do Chacrinha fechando assim o fim de tarde e o inicio da noite Global.

Eu participava de dois programas humorísticos da TV Tupi paulista: Deu a Louca no Show, dirigido pelo saudoso Paulo Celestino (já falecido), e Agencia Lig-Pag, dirigido pelo Wilton Franco.

No intervalo da gravação de um dos programas acima mencionados, reunidos no corredor de acesso ao estúdio, nós aguardávamos o reinicio das gravações no maior papo, recheado de momentos hilariantes de humor e imitações improvisadas, sem a tutela da irritante censura na qual eram submetidos nossos textos oficiais a serem gravados.

Nesse dia me lembro da participação de alguns colegas como o Gilberto Fernandes (Gibe, já falecido), Vianna Junior (falecido), Rony Cócegas (falecido), Roberto Ronney (falecido), Ankito (falecido) Marcos Plonka (falecido), Ary Leite (falecido), Roberto Marquiz (Teobaldo), Clayton Silva, e outros que não me lembro agora e nem sei se ainda estão nesse nosso mundo.

Havia muita alegria, risos então eram intensos, quando um dos redatores dos textos do programa e também um dos responsáveis pela minha carreira artística, vendo aquela bagunça resolveu brincar com o pessoal, e dirigindo-se ao grupo disse:
-“É pessoal! Aqui fora do ar vocês agradam muito, quero ver vocês agradarem assim quando estiverem em cena”.

E na hora, como que combinado, ouviu como resposta de um coral ensaiado, no meio de muita gargalhadas:
-“ Aqui a gente agrada muito por que aqui o texto tem qualidade, é todo de nossa autoria”.

Foi uma gozação só, até o termino das gravações algumas horas mais tarde, fazendo todos esquecerem talvez por alguns poucos dias, que já fazia dois meses que ninguém recebia salário.

Em tempo: o titulo dessa narrativa seria “Histórias da minha vida”, porém ao chegar ao final eu notei o grande numero de colegas agora já falecidos, percebi que alem de ser um dos presentes, eu também acabei me tornando um dos poucos sobreviventes.

Obrigado Senhor, por me deixar gentilmente ficar por aqui seguindo a minha trilha Pois nessa mudança de vida quero muito ter sempre o ultimo lugar da fila.

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