O dia dos pais e o meu pai.

Raras foram ás pessoas que conheci tão visceralmente apaixonadas por São Paulo como o meu pai.

Pequeno ainda, recém-chegado de Franca, se estabeleceu no bairro do Ipiranga, só saindo dali quando se casou e foi morar com a minha mãe na Rua Abílio Soares.

Sempre contou casos do Ipiranga e jamais esqueceu o apelido que lhe fora conferido no primeiro dia de cidade grande: Leão. Um moleque da mesma rua achou engraçado o seu sotaque interiorano. Com muita rapidez e decisão, o ainda pequeno Nelson acertou as ventas do garoto com um sonoro bofetão.

Mesmo nos momentos mais difíceis, de doenças, intermináveis dores e o consequente desemprego, não aceitou partir em busca de melhores dias. Na realidade, toda a família sofreu por isso, e sofreu muito. Tivemos a oportunidade de viver em outra cidade, mas… Ele nunca quis saber disso. O amor à cidade de São Paulo gritava ao seu ouvido de forma ensurdecedora, fazendo com que não conseguisse ouvir as necessidades da própria família e as argumentações insistentes da minha mãe.

Ele gostava muito de contar das dezenas de vezes que assistira ao filme "Escola de Sereias", mas não me lembro em qual cinema. Sobre a copa de 50… Quantas vezes eu o ouvi falando do Barbosa, o goleiro que sofreu a vida inteira por conta daquele maldito gol do Gigia no Maracanã!

Contava coisas do passado, do IV Centenário, de alguns jogos, coisas da família, de alguns amigos, mas o Ipiranga e as memórias dos tempos de funcionário da empresa Linhas Corrente permaneceram vivas no coração dele até o fim.

Meu pai faleceu em 1985, no norte do Paraná.

A última conversa que tive com ele foi diante da catedral de Apucarana. Só eu e ele. Quando resolvemos voltar para casa, dei-lhe um grande abraço, de igual para igual, profundo, demorado e macio. Eu não sabia que estávamos nos despedindo.

Pouco depois, quando o meu pai já estava em coma há uma semana, pude conversar sozinha com ele no hospital e agradecer todas as coisas que ele havia feito por mim e pelos meus dois irmãos, sobretudo o esforço monumental para que pudéssemos estudar em bons colégios. Falei pausadamente ao seu ouvido. Ele suspirou profundamente, mas partiu no dia seguinte.

Se eu pudesse colocar uma bandeira em seu caixão, colocaria a bandeira da cidade de São Paulo, de quem herdei tanto amor, essa infinita paixão que me inunda a alma.

Obrigada pai, por todas essas coisas.

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