O desfile

Estava em uma daquelas galerias da Rua Barão de Itapetininga comprando um radio de cabeceira para me distrair e espantar a tristeza do meu acanhado quarto de pensão quando percebi que muitas pessoas saiam das lojas e dos bares para observar um inusitado desfile, o desfile de um homem só. Vestia um saiote que lembrava os tocadores de gaita de fole escoceses e era seguido por um grande número de pessoas, que se divertiam com o estranho espetáculo. Entre vaias e aplausos lá ia o nosso personagem.

Não era, soube depois, algum psicopata ou desvairado. Era Flavio de Carvalho, um arquiteto consagrado, pintor e desenhista que exercia com brilho outras tantas atividades. Excêntrico e irreverente, seu passeio pelo centro da cidade era uma manifestação bem humorada contra a maneira de se trajar dos brasileiros. Tentava influenciar as pessoas com seu modelo, para que adotassem roupas compatíveis com o nosso clima. Não aceitava que em um país tropical como o nosso, de clima quente durante a maior parte do ano, se usassem roupas pesadas, sóbrias, desconfortáveis. Sem contar que naquela época o uso do chamado "terno" e a gravata eram indispensáveis.

No dia seguinte todos os grandes jornais de São Paulo noticiaram, com muitas fotos, a caminhada solitária de Flavio de Carvalho pelas elegantes ruas centrais da capital paulista e sua proposta para uma revolução na indumentária masculina. Vã foi a tentativa. A moda não pegou, mas Flavio de Carvalho será sempre lembrado como um símbolo de ousadia, coragem e criatividade.

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