O comprador e o vendedor de roupas

Eram pessoas diferentes, embora ambos fossem judeus.

O comprador passava pelas ruas gritando com seu sotaque: "compra-se roupa velha!". Quando algum morador se interessava em se livrar de alguma peça, saía à porta e o homem se aproximava para fazer negócio.

Ele examinava cuidadosamente a roupa, observando se não havia rasgos e analisava o estado geral da peça e caso se interessasse, pagava em dinheiro. Sempre dinheiro. Feito o negócio, ele continua seu caminho repetindo seu refrão: "compra-se roupa velha!".

O vendedor agia de forma diferente. Ele vendia roupas novas e usadas, mas não gritava pelas ruas. Ele ia passando pela rua e tocava a campainha de casa em casa, ou batia palmas quando a casa não possuía campainha. Ele vendia a prazo e à vista. Mas preferia vender a prazo, normalmente em três pagamentos. Era um negócio onde imperava a confiança. O comprador não assinava absolutamente nada, nem dava cheques pré-datados. O vendedor apenas anotava o valor da compra em uma caderneta e a data quando deveria passar novamente. Isso acontecia em São Paulo, bem no comecinho dos anos 60. Eu morava na Vila Clementino naquela ocasião. Ele sequer pedia o número de documento do comprador.

Nunca mais vi esse tipo de comércio em minha cidade e não sei se existe coisa parecida por aí. Sei que hoje existem marreteiros que vendem bugigangas, utensílios de cozinha e outras coisas em bairro de periferia. Sei que fazem vendas a prazo, mas o primeiro pagamento é à vista e nele já está embutido o valor total da mercadoria e uma margem de lucro, o que vale dizer que se o cliente não pagar o resto, o vendedor ainda saiu ganhando.

Naquele tempo não, os negócios além de serem feitos em confiança, não havia abusos como nos dias atuais.

Reconheço que esse saudosismo não leva a absolutamente nada. O mundo mudou, tudo evoluiu, inclusive a malandragem.

e-mail do autor: [email protected]