Meu cachorro chamado Suingue

Aos 67 anos de idade, lembro-me com saudade, de meu cachorro Suingue. Com saudade e com tristeza também. Suingue era um cachorro vira-lata, malhado, preto e branco. Tinha sobre um dos olhos uma mancha preta, que lhe dava um charme especial. Era um cão esperto, inteligente, até um pouco malandro. De acordo com informações de meus pais, Suingue chegou em casa quando eu tinha três ou quatro anos de idade.

Morávamos no bairro do Cambuci, na rua Sinimbú, próxima ao largo do Lavapés. Era um casarão antigo, onde residiam também outras duas famílias, fato muito comum na época. Tenho boas lembranças dele. Uma delas refere-se ao mês de fevereiro, no distante ano de 1946, quando minhas tias, que viviam conosco, resolveram fantasiar Suingue de Pierrô (tenho uma foto antiga) e o ensinaram a dançar a música Pierrô e colombina sobre duas patas.

Mal tocava a música no rádio, Suingue se levantava e ficava rodopiando. Era muito engraçado. Meu pai possuía um caminhão e prestava serviços para a Cia. Antártica Paulista, entregando bebidas nos bares, clubes, boates. Aos domingos, íamos todos, inclusive Suingue, até a cidade de Santos, para os tradicionais piqueniques nas praias, cujo prato principal era “frango com areia” (muitos dos senhores devem ter passado por isso quando eram crianças).

Suingue parecia perceber que era domingo, pois logo cedo ficava próximo da porta de casa, esperando por meu pai. Quando ele a abria, Suingue corria feliz e latindo, com o rabo abanando, até o caminhão, pronto para viajar. Para mim era uma grande felicidade ter meu cachorro por perto, para brincar. Lamentavelmente, numa noite, minha mãe se desentendeu com uma das mulheres que morava na nossa casa. Foi uma briga feia, ela meteu o rolo de macarrão na cabeça dessa mulher, que foi para o hospital e meus pais para a delegacia.

Esse fato nos obrigou a mudar de casa. Saímos do bairro e fomos para a Vila Pompéia. O dia da mudança foi um dos mais tristes de minha vida, pois tivemos que abandonar meu querido cachorro. Com lágrimas nos olhos, volto ao passado e o vejo, olhando assustado para o caminhão, carregado com nossos móveis. Sentado na carroceria, entre os móveis, vi Suingue pela última vez, latindo e correndo atrás do caminhão.

Já cansado, sentou-se no meio da rua e ficou olhando para mim. Chorei muito, por vários dias. Minha mãe me explicou que o motivo do abandono foi por causa da proibição do locador de nossa nova casa, de termos animais. Posteriormente tive outros cães, como Bingo, Sultão e Mel, personagens de outras histórias. Contudo, jamais esqueci meu fiel e amigo Suingue.

E-mail do autor: [email protected]