Leia as Histórias
Corria o ano de 1957. Este "escrevedor" de memórias vivia seus 17 anos e torcia para a chegada do ano de 1958 quando então, com a maioridade completada, poderia ingressar em cinemas que tinham na programação filmes proibidos a menores de 18 anos, frequentar ambientes noturnos mais sofisticados, exibir seus dotes de dançarino para uma nova plateia. Enfim, ver-se liberto dos tabus da menoridade.
Certa noite, reunido com os demais membros dos Duques de Piu-Piu, foi decidida a saída para o jantar em uma churrascaria no centro de Sampa. A escolha recaiu na Churrascaria Guacyara, estabelecida no primeiro quarteirão da Avenida Rio Branco, na calçada do lado direito de quem ia do Largo Paissandu em sentido à Avenida Ipiranga.
Escolha feita, nos dirigimos para a referida casa de pasto. Saímos da Rua Manoel Dutra (nosso ponto de reunião era o Bilhar Rex), descemos a Rua Santo Antonio, entramos no Viaduto Major Quedinho, atravessamos no cruzamento da Rua São Luiz com a Rua da Consolação e a Rua Martins Fontes e entramos na Rua Xavier de Toledo. Alcançamos a Praça Ramos de Azevedo e nos preparamos para entrar na Rua Conselheiro Crispiniano quando percebemos uma movimentação fora dos padrões daquela região. Pesquisando um pouco mais percebemos que algumas pessoas desenvolviam um trabalho manual inusitado para o horário.
Lógico, jovens e curiosos, fomos averiguar, de perto, o que de fato estava acontecendo. Vimos que a causa de toda a movimentação era o trabalho de alguns artistas estrangeiros que preparavam a cena para algumas apresentações acrobáticas que seriam realizadas nas noites seguintes. Eles estavam promovendo a instalação de cabos de aço que iriam atravessar o Vale do Anhangabaú no topo do Edifício Matarazzo (Praça do Patriarca) até o prédio da Light (hoje Shopping Center Light).
Desnecessário dizer que nossa curiosidade adiou por algumas horas o alvo de nossa jornada, o jantar da noite. Ali nos quedamos apreciando, junto com mais uma centena de transeuntes noturnos, as peripécias que se fizeram necessárias para por a termo a missão daqueles artistas.
Ao mesmo tempo em que assistíamos a instalação dos cabos de aço, obtínhamos informações a respeito do espetáculo. Soubemos então que o espetáculo seria de acrobacia sobre os cabos de aço e, consequentemente, a travessia da trupe "Zugspitzartisten", em espetáculo único de equilibrismo.
Soubemos mais ainda, os artistas iriam precisar de colaboradores para a venda de flâmulas, lembranças, fotos e outras bugigangas e sustentá-los com a renda auferida. Eu, mais descolado e habituado a tais expedientes rapidamente me propus a fazer parte desses colaboradores e, enquanto arrecadava contribuições, além de ganhar uns trocados, veria o espetáculo de locais privilegiados. Ledo engano. Não existiam locais privilegiados. A afluência de publico foi tão grande, (chegava ultrapassar a casa do milhar a cada noite), que nós, os colaboradores, tínhamos que fazer várias acrobacias para assistir aos números artísticos e cumprir com nossa obrigação de vender as tais bugigangas.
A cada apresentação, nós nos transformávamos, também, em acrobatas do solo, para não sermos esmagados pela turba, ou enganados por espertinhos. Os ganhos daquela empreita foram bastante pequenos se comparados aos riscos que corremos, mesmo porque tínhamos que, ao final de cada apresentação, darmos conta de todas as quinquilharias que nos haviam sido entregues e do valor das mesmas quando vendidas.
Dinheirinho ganho com suor acrobático!
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Modesto Enviado por Modesto Laruccia - [email protected]