Leia as Histórias
Vila Invernada, Zona Leste, São Paulo. 1954? 1955? Exatamente não me lembro, mas sei que era pequenina. Até então, as duas irmãs só haviam ganhado aquelas bonequinhas cor de rosa peladinhas (deviam medir uns 6 centímetros), que a mãe comprava na feira.
Ia chegar o Natal. Elas esperavam animadas pelo Papai Noel que lhes traria os tão almejados presentes. Elas não sabiam como ele entrava, pois dormiam cedo e só viam os presentes ao acordarem; eram depositados embaixo de um cipreste no qual minha irmã dependurava balas e bolas de algodão. Umas poucas bolas coloridas - que minha mãe caprichosamente guardava ano a ano - e o ponteiro verde todo trabalhado, lá no alto, sinalizavam a época.
Mas aquele Natal seria bem diferente. Quanta alegria ao abrirem as caixas e notarem que havia em cada um, uma boneca igualzinha à outra, feitas de celulóide (blargh) e para felicidade de ambas, era o máximo que se podia pensar em ganhar, oriundas que eram de família modesta: o sonho de consumo, as bonecas que andavam! Você dava um pequeno impulso e as pernas se moviam (uma de cada vez)... Quanta emoção!
Os pais, então, felizes por nos proporcionarem essa esperada felicidade. Não é necessário dizer que iríamos passar o dia todo e por que não a semana admirando nossos presentes, se não tivessem acontecido dois incidentes. O primeiro: a minha irmã, tão cuidadosa, delicada, feliz da vida após observar orgulhosa e feliz o seu presente, decidiu colocá-lo na caixa em que viera. E não se soube até hoje como, a boneca lhe escapou das mãos, partindo-se irremediavelmente em vários pedaços. Dizer do semblante de decepção dela não é tarefa fácil. Ficou triste, chorou, mas se conformou, pois sobrara uma, a minha.
E eu, feliz, quis descer as escadas para ir à casa de minha tia no mesmo quintal, contar aos meus primos. Usava tamancos de madeira e os tirava ao chegar à porta de entrada da casa dos tios. Desde pequenina, era elogiada por esse meu jeito (hoje, só restam as lembranças). Assim fiz e entrei correndo, feliz da vida. Não sabia que o chão de “vermelhão” era tão liso: ao atravessar a sala correndo escorreguei, já no chão fui parar apenas quando minha testa se chocou contra a quina do batente, fazendo um corte vertical.
Correria geral, sangue escorrendo, minha mãe desmaiada. Meu pai imediatamente me levou à farmácia; lá me fizeram curativo e até hoje a cicatriz marca minha testa. A lembrança de um acidente, mas de um Natal feliz, no qual ganhei meu primeiro brinquedo de verdade.
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