O quartel general da família era na casa onde eu morava com meus pais, a casa da nona, casa do nono e a casa de todos.
Como tradição, a família reunia-se todos os domingos lá; era uma festa semanal: as mulheres faziam suas comidas, cada vez mais, pois a família aumentava todo ano. Os homens tinham seu espaço cativo no "barracão", espaço destinado ao jogo da "bisca" entre um gole e outro de um bom vinho ou uma cachaça especial.
A nós crianças, cabia-nos a parte da diversão criativa. Às vezes disputávamos longos campeonatos de ping-pong, que levava meses até o resultado final. Ou então, campeonato de ginástica nas barras, balanças e materiais simples, como ferro e concreto, instalados por um tio no quintal da casa, para nossa diversão.
Mas a minha diversão preferida eram as apresentações de dublagem de cantores e conjuntos, mais ou menos o que hoje se chama de karaokê ou videokê. Só que eram feitas com performance, caracterização, penteado etc. Eram ótimas.
Nossas dublagens preferidas eram de Rita Pavone e dos Beatles. Aqui cabe um parênteses, nossos instrumentos, feitos por nós eram assim compostos: guitarras = caixas de madeira lixadas com o formato próprio e cabo idem; bateria = latas de 18 litros de óleo, com banquetas de madeira feitas das mesmas caixas; microfones = rodos e vassouras de pelo, cujas bases serviam de apoio de pés para acompanhar o ritmo.
Pois bem, éramos um sucesso; e eu era o Paul! Numa das apresentações, meu primo, o "George Harrison", no entusiasmo da música, pisou com muita força na base do "microfone", e a ponta da vassoura enfiou em seu olho esquerdo. Correria, choradeira, pronto-socorro, felizmente nada de muito grave aconteceu, mas foi o suficiente para encerrar nossa carreira de ‘cover’ dos Beatles.
Só nos restava continuar imitando Rita Pavone, que não precisava de tanto aparato nas apresentações. Mas como ela só fez sucesso um uma música, o interesse acabou logo. Nosso negócio era ser o quarteto de Liverpool! Não deu mais, voltamos às competições de ping-pong e exercícios nas barras.
Hoje, os outros membros dos Beatles Cover da família Ballabem estão distribuídos entre o Ipiranga, Tatuapé, Sapopemba e Campo Grande, no Mato Grosso do Sul; nenhum é artista.
E foi assim que por um tempo, por um maravilhoso tempo, eu fui Paul McCartney…
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