Quando o conheci ele morava na Lapa, bairro que o viu nascer e crescer. No início da década de 50 convivemos juntos por certo tempo, e desfrutamos da afinidade que nos unia: andar de bicicleta no velódromo do Parque da Lapa. Ele tinha uma francesa importada, com câmbio. A minha era nacional, sem marchas, e emprestada. O gosto por engenhosidades levou-o a colecionar a revista Mecânica Ilustrada e por influência, à sua entrada na faculdade de arquitetura. Formara-se na Nacional do Rio de Janeiro. Apesar do parentesco não o vi mais. Notícias suas, só poucas, e através da sua mãe, ocasionalmente. Como no lançamento do seu livro Panamérica.
Seu primeiro emprego não poderia ser melhor, admitido que fora na Televisão Globo, cargo de arquiteto de cenários. Mas não durou. Já estava com o micróbio da arte cinematográfica. Quando estudante, se reunia com outros de tendências para a 7ª Arte. Passou a escrever roteiros para os seus filmes, e alguns foram realizados. Os bares que freqüentava eram de artistas, as amizades foram aparecendo. Gente do Teatro, do Cinema, de Shows. Mas foi com alguns poucos que os laços mais se estreitaram, caso de Jô Soares, Caetano Veloso, Gil, Tom Zé, entre outros. De muitas idéias, uma, a Tropicália, marcaria muito a sua personalidade, e foi para ficar. A década de 60, de mudanças drásticas para o mundo, mudou também para ele. O deslumbramento para um mundo novo que surgia, trouxe-lhe hábitos de consumo que o desviou para caminhos sem volta. Caminhos para a fossa.
Com os livros: Lugar Público e Panamérica renderam-lhe bom dinheiro, coisa que ele desprezava, pois já estava voltado para o mundo esotérico, sua espiritualidade hindu regia agora um novo rtmo na sua vida. Vestia-se paramentado, e era chamado de Guru pelos amigos.
Os filmes na maioria de curta metragem, só agora tornaram-se objetos de interesse.
O regime militar deixou-lhe cicatrizes profundas e, aterrorizado, saiu do Brasil. Esteve na África e Europa. De volta ao Brasil, estivemos bem próximos, ele na Rua Goitacazes e eu na Tupí, mas não nos encontramos. A última vez que o vi foi num dia de semana, ele estava caminhando em direção à Praça Marechal Deodoro, tendo nos braços uma cadeira de praia e um guarda-sol; usava short e uma jaqueta dessas refletivas que os garis usam. Mas a melhor lembrança vem do tempo que eu o acompanhava para uma academia de jiu-jitsu na Martinico Prado.
Depois de uma longa e grave enfermidade, sempre assistido pelo irmão, morreu dias atrás, sem ter consciência de ser pai por duas vezes, com mulheres diferentes.
Falei-lhes de José Agripino de Paula e Silva, arquiteto, escritor, e cineasta.
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