Cambistas de ingressos de outrora

Com certeza, alguns dos leitores e participantes deste lindo quadro de saudades, foram protagonistas deste meu relato.

1958. Éramos cinco amigos inseparáveis. Eu Paulão – o mais alto, o Paulinho – era o mais baixo, Nenê – o mais magro, Nelsão – o mais cara de pau e o Leo – careca que era o mais sério. Todos da Mooca com exceção do Leo.

Nos finais de semana juntávamos os cinco para irmos aos chamados bailes de família (Palácio Mauá, Casa de Portugal, Clube Homs, entre outros). Conosco, juntavam-se outros amigos como Theodoro, Carlão, João bobeira e mais alguns. Para nós, eram sagrados os bailes de sábado e domingo (tarde e noite). Esses bailes, uma boa parte das vezes, exceto os de domingo à noite, eram realizados por escolas e faculdades com o objetivo de angariar dinheiro para suas festas de formaturas, inclusive o baile de gala.

Os convites eram vendidos antecipadamente pelos alunos sendo que, os que sobravam eram vendidos nas portas dos salões. Além da nossa turma de amigos, cerca de cento e cinqüenta pessoas divididas em outras turmas, compareciam religiosamente nesses bailes de fim de semana. Ninguém ficava sabendo antecipadamente qual entidade iria realizar o evento. Simplesmente todos se apresentavam, automaticamente, naquela certa hora para o baile. Eram pessoas que, embora cada um com sua turma, quase todos já se conheciam.

Todos adquiriam seus convites na porta, sem nenhum problema, embora a venda de convites nas portas dos salões fosse proibida. Mas os dois fiscais da prefeitura e os seis guardas civis que trabalhavam nesses eventos (sempre os mesmos) fechavam os olhos, deixando a venda transcorrer com tranquilidade.

Nessa época, os bailes eram autorizados e fiscalizados pelo DDP (Departamento de Diversões Públicas); isso até meados de 1960. Porém, a partir daí tudo mudou. O DDP passou a ter um novo diretor que exigiu de seus dois agentes uma fiscalização rigorosa para impedir a venda de convites nas portas dos salões, onde eram realizados os citados bailes.

Foi um reboliço. Cerca de cento e cinqüenta pessoas na porta, com dinheiro e impedidas de entrar para o baile, pois não haviam mais convites à venda. Os mais chegados, às vezes, conseguiam entrar junto com os músicos ou através dos guardas. Os demais, a imensa maioria, tinham que partir para outros programas.

Como logo no início do problema houve um baile de um colégio da Mooca, compramos os convites antecipadamente. Foi ai que tivemos uma idéia: Se ficássemos sabendo com antecedência qual era a entidade que organizaria o próximo evento, poderíamos comprar os convites diretamente. Conseguimos, contando com a ajuda de um funcionário do DDP.

A partir daí, chegávamos com os convites nas mãos. Então, as outras turmas começaram a pedir para comprarmos os convites para eles também. Diante disso, resolvemos ganhar dinheiro junto à entidade que promovia o baile.

Íamos até o colégio propor a compra das sobras dos convites por um preço 50% mais barato, mas os problemas com os fiscais e os guardas ficaram por nossa conta. A oferta, claro, era aceita na hora. O preço que vendíamos para o pessoal era o mesmo vendido antecipadamente pela entidade organizadora, sem acrescentar um centavo.

Só em duas ocasiões cobramos 20% a mais porque as entidades organizadoras não quiseram dar desconto. Para não deixar o pessoal na mão, resolvemos aceitar. Com o passar do tempo, o pessoal ia aos bailes com a certeza de entrar, pois sabiam que estaríamos em frente ao salão com os ingressos.

No começo tínhamos que tomar cuidado com os dois fiscais que, logo depois, ficaram nossos amigos e acabaram relaxando em relação à determinação superior. Do nosso lucro, os guardas que eram nossos colegas ficavam com cerca de 20%. E assim agimos por um bom tempo: Ganhando dinheiro e resolvendo o problema das demais turmas sem cobrar-lhes qualquer centavo a mais e participando ativamente dos bailes. Bons tempos. Saudades.

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