Bailarino, o motorneiro show de Santana

Uma história de solidariedade jamais esquecida.

Aconteceu em 1949. Eu morava na Rua Major Caetano Costa, travessa da Rua Voluntários da Pátria, rua essa que terminava em linha reta com a pista do Campo de Marte.

Esperava todos os dias o bonde com destino ao largo São Bento, me pendurando no balaustre e fixando a ponta do pé no estribo. O passe eu levava no bolsinho do paletó ou segurando na boca para facilitar o cobrador. Era uma rotina diária seguida com muito sacrifício e disciplina. O motorneiro era super conhecido e festejado das linhas de Santana e Olavo Egidio, um amigão que cumprimentava todo mundo e todos o cumprimentavam. Era uma festa.

Eu jogava basquete no Clube Esperia, e fraturei o perônio trincando a tíbia da perna esquerda em um jogo contra os Argentinos no ginásio do Pacaembu. Tive a perna esquerda engessada da ponta do pé até a virilha e só conseguia andar apoiado em uma bengala. Não podia deixar de trabalhar e o sacrifício era muito grande. Caminhar até a esquina da Rua Voluntários da Pátria, subir no bonde e descer no largo São Bento, era realmente difícil.

Aí aparece o Bailarino, o motorneiro mais alegre da história que, sabendo da minha dificuldade, me proporcionou uma alegria inesquecível.

Às sete horas e dez minutos ele aparecia, parava o bonde na esquina da rua onde eu morava, descia, me ajudava a subir, reservava lugar ao seu lado e lá ia eu em pé lhe fazendo companhia. Era muito do seu jeito. Chegava ao largo São Bento, todos desciam e outros subiam. Dava a volta no largo, parava o bonde na esquina da Rua São Bento e me ajudava a descer. Lá ia eu caminhando com minha bengala até a Rua da Quitanda. Não havia preocupação com a volta e eu acenava agradecendo.

Isso durou os 70 dias que permaneci engessado e faz parte da minha história. Tenho um pedacinho da mim reservado ao Bailarino, homenagem aos bondes 42 Olavo Egidio e 43 Santana.

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