Avenida do Estado a pé

Um bom passeio para um domingo pela manhã é ir do Ipiranga ao Mercadão a pé, pela Avenida do Estado.
Conheço bem a Avenida, por ela passo diversas vezes de carro ou de ônibus. Mas nunca tinha feito este trajeto da forma mais simples e ao mesmo tempo mais complexa: caminhando.
Caminhando pela Avenida do Estado, sentido centro, da Praça Alberto Lion até o Mercado Municipal, aprendemos diversas lições: A primeira é que, definitivamente, as grandes avenidas de São Paulo não foram feitas para o pedestre. Calçadas quebradas e/ou estreitas, locais em que é quase impossível atravessar a rua com segurança são muito comuns neste trajeto. Outra lição importante é adquirida ao vermos de perto a vida dos que fizeram os viadutos do Glicério de moradia, inclusive com ferozes cães ameaçando pedestres que invadem o "terreno privado".
Merecem destaque no referido trajeto:
Um prédio abandonado que, lá no último andar, uma brecha no concreto maltratado pelo tempo permitiu o nascimento de uma pequena árvore, algo deveras emblemático;
Um belo prédio em estilo medieval, que hoje abriga uma igreja evangélica. Dizem os mais experientes que o prédio já foi sede da loja "Mesbla".
As estações modernistas do Expresso Tiradentes (Fura-Fila), que, com seu amarelo e azul berrantes, contrastam com o cinza predominante da avenida.
As praças pessimamente conservadas; que, em total desvirtuamento de sua função na cidade, servem de depósito de lixo.
O belo prédio do Quartel do Parque Dom Pedro, assustadoramente mal conservado. Aconselho aos corajosos desbravadores urbanos que não façam movimentos bruscos quando estiverem próximos da construção, sob pena de provocar a ruína deste que deveria ser um ponto turístico de nosso centro.
Avançando o caminho, chegamos ao Parque Dom Pedro e, quase no Mercadão, temos de desviar de inúmeros profissionais informais que tentam alocar a enorme quantidade de automóveis que, atraídos pelo Mercadão, afluem ao centro de São Paulo. Não é fácil achar uma calçada que não tenha sido totalmente invadida por um carro estacionado.
Chegando finalmente ao Mercadão avistamos o edifício São Vito, que dispensa comentários e, em absoluto contraste, admiramos a inenarrável beleza do Mercado Municipal, projeto de Ramos de Azevedo. É quase como adentrar em um universo particular em meio ao caos.
Quem quiser se aventurar, recomendo: O passeio vale a pena. É muito bom andar por São Paulo, sentir sua vibrante pulsação, em uma atitude de vivenciar efetivamente a cidade. Recomendável em tempos em que surgem esses conceitos de morar denominados "bairros privativos", condomínios de luxo que privatizam áreas da cidade e permitem que seus moradores usufruam privativamente do local, minimizando ao máximo o contato com a realidade externa.
A cidade é nossa, de absolutamente todos os que nela moram. Se a quisermos melhor, temos que senti-la, conhecê-la, nos preocupar com suas mazelas como se fosse alguém da família que não está passando muito bem. Não será o isolamento em ilhas de segurança que nos trará uma cidade melhor. O caminho para alcançarmos tal meta passa com certeza pela identificação de seus problemas, pela vontade comum de resolvê-los e pelo incondicional respeito à vida em coletividade.

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