As meninas do Pensamento

Quando terminei o ginásio, aos 14 anos, fui aprender datilografia, como todas as minhas amigas para começar trabalhar.

Todos os dias meu pai recortava do "Diário Popular" os anúncios de emprego, e lá ia eu para o centro com minha mãe, atrás do primeiro emprego. Mas no fundo eu já sabia que o emprego seria no "Círculo Esotérico da Comunhão do Pensamento" ou "Editora Pensamento". Lá a maioria das meninas da minha idade, que moravam no IAPI, começavam sua carreira de "auxiliar de arquivo", catando milho nas máquinas Remington e depois de aprender muitas coisas, alçavam voo mais alto.

O prédio era um castelinho, que ficava na Rua São Paulo, com Rua Conselheiro Furtado, e que foi demolido para dar lugar à Avenida 23 de Maio, no tempo do prefeito Faria Lima. O prédio tinha fama de mal assombrado e nenhuma de nós tinha coragem de descer suas escadas ou o elevador desacompanhadas.

Todas nós subíamos, todos os dias, bem elegantes, a Rua São Paulo, para o nosso (geralmente) primeiro emprego, ganhando meio salário mínimo que era de muita ajuda em casa. No final da tarde voltávamos felizes e correndo para irmos ao colégio, muitas vezes bem longe de casa. Chegávamos do colégio por volta da 12h da noite e no dia seguinte estávamos prontas para o trabalho, bem cedinho.

Bons tempos onde não se falava em trabalho escravo e meninas de 15 anos trabalhavam com amor para ajudar em casa e "ser alguém na vida".

Ainda tenho muitas amigas daquele tempo e até onde eu sei ninguém ficou traumatizada ou com problemas emocionais por ter que trabalhar tão cedo, ao contrário, o trabalho só nos fez mais fortes e mais felizes.

PS. Falo das meninas, mas também havia os rapazes que trabalhavam no "Pensamento". Bons tempos de alegria e saudade de uma juventude sem muito dinheiro, mas cheia de grandes valores.

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