A Grande Viagem

Lembro-me vagamente, era junho de 1958, trinta dias de férias escolares, trinta dias de férias do papai na empresa. Morávamos na Vila Bonilha, Pirituba. Então combinamos: A grande viagem, uma viagem com toda a família, papai, mamãe, eu com 8 anos, um irmão com 7 e outro com 3 anos. Iríamos para um lugar muito distante do interior de São Paulo, uma cidade chamada Jacareí, imaginem, hoje existe até ônibus circular para lá, mas naquele tempo e para nossa família era a viagem dos sonhos.
Logo foram preparados os apetrechos da viagem: malas, bolsas, sacolas e etc., afinal de contas iríamos viajar para o interior. Foi chamado um taxi (vejam só que chique!) que nos levou até a rodoviária no centro de São Paulo. Chegando lá, tomamos um lanche, não me lembro se foi na lanchonete ou se minha mãe havia levado aquele famoso frango com farofa.
Depois embarcamos no ônibus da viação pássaro marrom, com destino a Jacareí. Lá fomos nós felizes da vida. Chegando ao destino na praça principal da cidade, desembarcamos com todas aquelas tralhas e imediatamente contratamos um veiculo adequado para nos levar até o sitio da tia Maria, que era nosso destino. O veículo contratado foi nada mais nada menos que uma charrete! Imaginem toda a família, aquele monte de malas e sacolas e condutor, puxado por aquele coitado daquele pangaré magricelo.
Chegando ao sitio, foi aquela comemoração, abraços, confraternização, alegria pelo reencontro, pelo menos por parte dos visitantes, já pelos que estavam nos recebendo não posso garantir tanta alegria, vejam, uma família composta de cinco pessoas, cai de para quedas em sua casa e fala “vamos ficar aqui por 30 dias”. Deve ser uma tortura chinesa.
Para nós, os três irmãos visitantes foi uma tremenda farra. Subir em árvores para pegar frutas, nadar na represa, andar de bicicleta, comer no quintal no prato de alumínio e colher (lá eles não usavam garfos), ver os bichos do sitio e muito mais novidades.
Certo dia, peguei a bicicleta do primo e a empurrei até a porteira lá no alto do morro, o sitio era encravado em um vale. Então enfiei o pé no quadro da bicicleta (a bicicleta era muito grande para o meu tamanho) e soltei ladeira abaixo, meu pai vendo que eu não iria conseguir adentrar ao sitio, pois a porteira estava fechada, correu e conseguiu abrir a dita cuja, no que eu passei como um foguete, inclusive por cima do mata burro, indo cair de bunda no formigueiro ao lado do ribeirão. Ai foi mais de uma semana todo inchado pelas picadas das formigas. Passado esse susto, a vida continuou até a triste despedida pelo final das férias.
O expresso “beiçudo” (charrete) foi chamado para fazer o trajeto de volta, até a rodoviária da cidade. Depois embarcamos no ônibus que nos deixou na rodoviária de São Paulo, de lá fomos conduzidos por um taxi até nossa casa. Chegando em casa, que estava fechada por 30 dias, fomos calorosamente recebidos por uma ninhada de pulgas que havia tomado posse do recinto durante a nossa ausência.
E assim terminou a nossa aventura! Mas até hoje sinto saudades. Passeio igual a este nunca mais fizemos…

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