A Eterna Escola da Vida – V Parte

Em fins de maio de 1953, eu estava desempregado por conveniência, aguardando a chegada de novidades e ofertas interessantes sobre um novo emprego. Meu pai, nessa ocasião, estava prestando serviços nas obras da residência do grande empresário Gustav Willy Borghoff, à Rua Bauru, no bairro do Pacaembu.

Em uma das conversas entre meu pai e o "Seu Gustavo", houve a citação do meu nome e um ligeiro currículo a meu respeito. O Seu Gustavo, em sua resposta, disse mais ou menos o seguinte: "Eu acho que seu filho pode ser a pessoa que eu procuro há algum tempo. Este é o meu cartão, peça a ele que me procure pessoalmente; se depender de mim, ele já está empregado". Recebi o recado, dirigi-me confiante para a entrevista conforme o combinado.

O meu primeiro contato com esse senhor, frente a frente, olho no olho, deixou-me bastante impressionado. Ele me fez algumas perguntas de praxe; acredito que minhas respostas foram satisfatórias. Ao confirmar a sua satisfação, disse que a vaga era minha e só dependia de eu aceitar ou não. O salário oferecido agradou-me; as condições, idem. O ambiente parecia ser excelente.

Fui apresentado ao casal Antonio e Emery Redini, encarregados do departamento pessoal, para os devidos acertos e registros. No dia 1º de junho de 1953, comecei a trabalhar na firma Borghoff S/A. (filial de São Paulo), sediada à Avenida General Olimpio da Silveira, 63, quase em frente ao ex-circo Piolim, no bairro de Santa Cecília.

Fui contratado para a função de correntista, no setor contábil. O horário de trabalho era de 8h00 as 18h00, com uma hora de almoço, de segunda à sexta-feira.

Na parte da manhã, atualizava e completava o meu trabalho e, sempre que sobrava tempo, colaborava com meus colegas da contabilidade e de outros setores com cobranças, pagamentos de contas bancárias, arquivos, cópias de faturas, diário, entre outros. Sem perceber, eu estava conquistando a simpatia, amizade, inclusive a confiança de todos, principalmente da diretoria.

Fiquei surpreso e emocionado quando recebi o primeiro salário: era superior ao combinado. Achei que havia um engano. Fui conversar com o Seu Redini, do DP, e disse-me que estava correto e tinha sido aprovado pelo diretor, o Seu Gustavo. Fui então agradecer-lhe às suas considerações para com a minha pessoa. A sua resposta foi: "Senhor Antunes! O senhor não tem o que agradecer, o senhor fez por merecer! Nós vamos aumentar ou renovar o quadro de funcionários, contamos com sua colaboração e indicação de gente igual ao senhor."

A matriz da Borghoff S/A. estava sediada à Rua Riachuelo, 243, Rio de Janeiro, no bairro da Lapa. O seu diretor era o irmão mais velho do Sr. Gustavo, de nome Guilherme Borghoff. Essa empresa tinha representantes em Belo Horizonte, Recife e Porto Alegre.

O seu fundador foi o Sr. Willy H. Borghoff, em 1912, e ele era o presidente do grupo. Os meus colegas de São Paulo eram compostos por: Moacir Teixeira e José Carlos Vasconcellos, gerentes do setor de Vendas; Ângela e Fiuka, que trabalhavam no caixa; Walter Canzian (casou-se com a Ângela) era vendedor balconista; o Siqueira, motorista da empresa, responsável pelo transporte das mercadorias; o Getulio (baixinho quanto eu) era auxiliar de vendas. O encarregado da limpeza era o Seu Henrique, descendente de alemães; a Lore (casada com o Klauss, ambos alemães) era secretária do diretor; Gina, secretária do Seu Moacir; a Irene, secretária do Seu José Carlos; o Terú (descendente de japoneses), eletricista; o Seu Oscar, marceneiro, fazia as embalagens p/o almoxarifado; o Arnold Gunther, assistente do diretor; o Hugo, cobrador; a Vanilda, secretária do Sr.Steffens; Dona Maria, copa e cozinha; o Bob Miessler (norte-americano) era nosso professor de inglês e trabalhava no setor técnico.

Tinha também o Reinaldo Rizzo, o arquivista, copiador de faturas e diários; o Antoninho, cobranças e contas a pagar; os vendedores-propagandistas Cipolli, Brunelli e Jurandyr; e o Seu Gerson, o encarregado dos almoxarifados.

Algum tempo depois, surgiram novas contratações, algumas delas por minha indicação. Por exemplo: meu tio Agostinho Cucchi (auxiliar do almoxarifado); o Dorival Tomazin, meu colega da escola de canto (auxiliar do almoxarifado); o meu primo José Ornaghi (operador e digitador da máquina contábil); o Carlos Rezende, também colega da escola de canto (auxiliar contábil); o Alberto Epíscopo, meu vizinho e irmão do meu tio Sebastião (auxiliar contábil).

Com a transferência da matriz do Rio de Janeiro para São Paulo, para o setor contábil vieram os irmãos Helio e Djalma e um outro elemento, do qual não consigo lembrar o nome. Para a função de contador responsável, chegou o Alicio Acilio de Mesquita. O Olavo e seu irmão (deste também não consigo me lembrar o nome) foram contratados para auxiliarem na contabilidade. Alguns anos depois, o Olavo foi promovido e passou a exercer o cargo de contador responsável. No bairro da Lapa (SP), funcionavam os setores mecânico, técnico, elétrico, chefiado pelo alemão Sr. Lemm.

No ano de 1953, morava com meus pais e irmãs nos fundos da propriedade do meu tio Sebastião Epíscopo, na Rua Herculano de Freitas, 299, bairro da Bela Vista, e fazia, sempre que possível, a caminhada a pé de casa até o novo emprego, e vice-versa.

Nesse mesmo ano, fui convocado pelo diretor para um estágio na matriz do Rio de Janeiro, a fim de aprender na prática a reconciliação das contas bancárias. Embarquei no avião da Aerovias Brasil, em Congonhas, e desembarquei no aeroporto de Santos Dumont. Tudo era novo para mim: a primeira viagem de avião, o hotel Globo próximo ao local do trabalho, a camaradagem do povo carioca e dos colegas do Rio. Eu tinha a liberdade de permanecer ali por mais tempo, um mês ou mais se fosse preciso. A saudade de São Paulo, da minha família e dos amigos foi mais forte, o que fez com que eu conseguisse completar o meu aprendizado em tempo recorde. Em menos de uma semana, no sexto dia, após o lanche da manhã, embarquei no primeiro ônibus de volta a São Paulo. Preferi voltar de ônibus para apreciar a paisagem.

No meu retorno a São Paulo, iniciei as funções de Reconciliador Bancário. Mais tarde, fui convocado pelo diretor, para por em prática um controle do Imobilizado. Era preciso, então, providenciar etiquetas metálicas numeradas para cada item e tipo. Com a ajuda de um técnico, conseguimos completar os serviços em cinco dias.

Tudo etiquetado, relatório detalhado por cada item; dali para frente, era só prosseguir, registrar as novas aquisições e eliminar as baixas.

Em maio de 1957, estava sendo organizada a empresa de origem britânica Equipamentos Joseph Lucas do Brasil Ltda., no bairro da Lapa, em São Paulo. O presidente era o Sr. Gustav Willy Borghoff, o auditor responsável era o Dr. Agostinho dos Santos Annes. Este senhor auditava várias firmas estrangeiras, e não podia assumir o cargo de contador da Lucas. Recebi então, por indicação do Dr. Agostinho, o convite do senhor Gustavo para assumir o cargo de contador. Fui indenizado, a titulo de gratificação especial, com uma quantia bastante generosa. Em 31 de maio de 1957, assinei com muita satisfação a minha carta de demissão. Eu estava deixando a Borghoff S/A.; porém, continuava indiretamente ligado à querida família Borghoffiana.

A Borghoff era, na minha modesta opinião, uma das melhores empresas que eu conhecera até então. Vivia-se nela como uma verdadeira família feliz, repleta de oportunidades, reconhecimento mútuo. As confraternizações tornaram-se inesquecíveis. Ao completar estabilidade (dez anos), o funcionário recebia certo número de ações e um precioso presente.

Após a minha saída, a firma Borghoff S/A. mudou-se para a Barra Funda, e lá permaneceu por muito tempo. O Sr. Gustavo faleceu e, em sua homenagem, a rua em que ela estava passou a chamar-se Rua Gustav Willi Borghoff. Ele era realmente um ser humano exemplar, um grande amigo e colega incomparável. Sinto-me compensado por ter participado desta preciosa "escola da vida".

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