O bairro paulistano do Brás é a própria pujança. É algo vivo e “doloroso'”. O Brás implica todos os dias uma rotina que começa às 2h da manhã; é o trabalho da madrugada, dos feirantes e lojistas dos dois mercados, o principal que todos conhecem e visitam e o segundo o dos hortifrutigranjeiros, das verduras e das frutas saborosas e dos aspectos mais saudáveis pelo menos na aparência.
Até nas ruas do bairro elas se encontram, os cereais... Desta vez o feijão de vagem longo e o da caixa do caju, até a baga é aproveitada. Um vendedor ambulante me diz que o pé da fruta vale o preço da caixa de caju.
Vi também que oferecerem duas mudas de coco por R$ 10. Só não comprei para não sacrificar as plantas com 12 horas de viagem. No mais, não havia por que não levá-las. O Brás, velho Brás.
Do taxista recebi a informação que o prédio da bolsa de Cereais do Estado de São Paulo mudara da Avenida Senador Queiroz para outro local, e aquele edifício de 12 andares transformado em um comércio variado de lojas e escritórios. No Brás, parece difícil algum não trabalhar, embora nas ruas haja muitos ladrões e o aviso que todo cuidado é pouco em se tratando de dinheiro nos bolsos. As quadrilhas estão sempre prontas para um novo golpe, atacar os incautos formalizando um agito qualquer.
Não vejo São Paulo depredada e mal cuidada. Vejo São Paulo adaptada aos novos tempos, ao seu dia a dia; não há tempo a perder e trabalho duro e constante. O relacionamento com os clientes que adentram os estabelecimentos comerciais a que me refiro são atraentes e com estilo.
Diz o proprietário da banca: você pega a pimenta, do tamanho do polegar, retira a parte verde que segura o fruto. Exponha-as no álcool por 20 minutos e repõe-nas a mesa para enxugar. Em um instante estão enxutas, pois o álcool evapora facilmente. Ponha-as em um recipiente fechado, lacrado e adicione azeite, alho, vinagre e sal.
Feche hermeticamente o vidro e abra-o por três vezes para a retirada do ar contido nela, até a armazenagem definitiva. Não deixe ninguém cheirá-la, que se evite o contato com bactérias da saliva. Está pronto o vidro de pimenta vermelha, não sei o nome da variedade, mas ela também serve como amuleto contra fofoca.
Pegue o limão e esprema-o. O limão limpará seu nome das imundas bocas e línguas. Vamos deixar as mandingas de lado e voltemos ao Brás.
Os taxistas negociam corridas pelo preço acordado e não pelo taxímetro. Do shopping Valtier até a região do mercado, o preço pedido é R$ 30, mas fechando em R$ 20 com quatro passageiros sai por R$ 5 a unidade/ passagem. Na volta, é preciso escolher o local de embarque, do contrário o taxista terá que fazer um retorno grande que não compensa. O preço é acordado, desta vez por R$ 30. Não tem discussão, se não quiser arrume outro carro. É assim a lei do mais forte e a lei da oferta e da procura.
Dos encontros nascem as conversas, nome, local de moradia. Todos dizem que lá onde moram é uma maravilha, um sossego. Do lugar onde moro, Santana, avista-se a Serra da Cantareira e sente-se o cheiro da mata. Moro em Santana, bem para lá de onde era o complexo do Carandiru.
Fico imaginando, vendo os protagonistas desses encontros casuais no Brás, a amizade que reina entre eles. Conversa vai, conversa vem sempre se chega a um acordo.
No mercado a hora é de degustação: um pastel, bolinho de bacalhau, quibe qualquer outro salgado sempre é bem vindo. Com suco, cerveja ou refrigerante percebe-se o gosto de cada um e a falta de cuidado na alimentação. Os obesos e os candidatos à obesidade já se destacam na adolescência.
Mas isso gente, é o nosso Brás. Gente se movimentando para lá e para cá, comprando, vendendo, oferecendo, e pechinchando. Não há quem resista a um bom negócio. É pegar ou largar.
São viagens feitas com curto espaço de tempo, umas horas apenas para matar a saudade da cidade que outrora foi palco de aventuras. Um sinal também é a discrição. Muitos não se revelam a que vieram, se a negócios, ou a passeio, ou a visita a um médico especialista, cada um carrega dentro de si seus motivos pessoais.
Foi assim que vi o Brás da última vez, Brás, o fabuloso Brás, nesse dia 30 de novembro, prenúncio de um novo final de ano e com as festas alegres de sempre.
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