Leia as Histórias
Era 2 de maio de 1960. Eu trabalhava no Aeroporto de Congonhas e morava na Vila Clementino. Para ir pra casa tomava dois ônibus: um do aeroporto até Moema e outro de Moema à Vila Mariana. Eu havia terminado meu turno de trabalho na Panair e estava do lado de fora da Ala Internacional de olho no aparecimento do meu ônibus e de ouvido atento ao radinho Spica de um amigo. A Rádio Bandeirantes, se não me engano, transmitia a execução de Caryl Chessman, o famoso Bandido da Luz Vermelha, que estava preso desde janeiro de 1948 e que, condenado à morte, conseguira vários adiamentos. Não havia morbidez em nosso interesse; esperávamos isso sim novo adiamento ou um indulto com comutação da pena em prisão perpétua. Meu ônibus apareceu e corri para o ponto situado na pista de baixo, na avenida Washington Luis, mas escorreguei e bati com a canela naquela mureta de pedra que separa as duas pistas. Mesmo assim consegui tomar o ônibus. Ao descer em Moema encontrei uma oficina de sapateiro que estava com o rádio sintonizado na transmissão da execução e havia muita gente ouvindo. Cerca de meia hora depois foi confirmada a execução. Alguns acharam bem feita, outros tinham lágrimas nos olhos e outros, ainda, certamente por terem lido seu livro “Cela 2455, Corredor da Morte”, expressavam a opinião do nosso jurista Nelson Hungria contra aquele “assassinato legal”. Passada a emoção, fui para o ponto de ônibus e só aí me dei conta de que minha meia estava encharcada. O sangue continuava a sair do buraco aberto na canela. Procurei uma farmácia próxima, fiz um curativo e fui pra casa. A cicatriz e a depressão no perônio existem até hoje. E por causa de um sujeito de outro país preso há 59 anos.
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